A siderúrgica Ternium, controlada pelo grupo italiano Techint, utiliza decisão de 2014 do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para deslegitimar a participação acionária da CSN (BVMF:) (Companhia Siderúrgica Nacional) na Usiminas (BVMF:). O objetivo é tentar reverter um julgamento recente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que resultou em ganho para a empresa.
Na última terça-feira (18.06.2024), a 3ª Turma do STJ decidiu por 3 votos a 2, ao analisar pedidos de declaração relativos ao julgamento de 2023, que a Ternium deverá indenizar a CSN em R$ 5 bilhões. Isso se deve ao fato de a empresa italiana não ter feito oferta pelas ações da CSN na Usiminas quando comprou a participação da Votorantim e da Camargo Corrêa em 2012.
Em 2014, o Cade decidiu que a CSN deveria vender uma participação de cerca de 17% na Usiminas em um prazo de 5 anos. O prazo foi prorrogado duas vezes, em 2019 e 2022. O Cade chegou a recusar pedido da CSN para participação na assembleia geral ordinária da Usiminas.
A Ternium entende que a decisão do Cade poderá anular o processo do STJ. A 3ª turma do tribunal entendeu, por 3 votos a 2, que a empresa italiana passou a controlar a Usiminas com a aquisição das ações da Votorantim/Camargo Corrêa, por R$ 4,1 bilhões. Parceira de 12% da empresa, CSN pediu R$ 5 bilhões na remuneração em ações, pois, segundo a defesa, seria necessária uma OPA (oferta pública de ações) aos acionistas minoritários.
A questão em disputa é a regra de ir junto, que permite que os acionistas minoritários de uma empresa deixem de ser sócios caso o controle da empresa passe para um novo investidor. A ferramenta serve para dar segurança aos integrantes da empresa em relação a um novo investidor que não tenha participação inicial no negócio. Está previsto na Lei das Sociedades por Ações de 1976.
De acordo com a lei, a alienação “direto ou indireto”de controle de companhia aberta somente poderá ser contratado sob condição de o adquirente“fica obrigada a realizar oferta pública de aquisição de ações com direito de voto detidas pelos demais acionistas da sociedade.”.
Define ainda que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) autorizará a alienação de controle, desde que verificado que as condições da oferta pública atendem aos requisitos legais. A comissão também é responsável por estabelecer padrões a serem observados na oferta pública.
O comprador da empresapoderá oferecer aos acionistas minoritários a opção de permanência na companhia, mediante pagamento de prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das ações e o valor pago por ação integrante do bloco de controle”.
A Ternium, após a aquisição, passou a deter cerca de 28% das ações da Usiminas. Ainda tinha menos ações do que a japonesa Nippon. Embora não detivesse apenas o controle acionário, passou a fazer parte de um bloco de controle da siderúrgica mineira, estabelecido por acordo de acionistas. O bloco é formado por Ternium, Nippon e Caixa dos Empregados da Usiminas.
A CSN, que era minoria, não recebeu oferta da Ternium pela sua participação. Seu argumento era que mesmo sem ter o controle sozinho, ela controla indiretamente a empresa por meio do bloco com a Nippon e o fundo de empregados. A CVM, em 2017, refutou que a empresa tivesse adquirido o controle. Então, a CSN entrou na Justiça.
INSEGURANÇA JURÍDICA
A decisão do STJ cria jurisprudência contrária às decisões tomadas nesses casos, o que preocupa o ambiente de negócios pela insegurança jurídica. Especialistas consultados por Poder360 Eles temem que a decisão cause incerteza em novos processos de compra de ações de outras empresas, como a privatização da Sabesp (BVMF:) (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo).
“A expansão do âmbito de proteção das minorias introduz um elemento de incerteza jurídica que pode afetar negativamente o apetite dos investidores. Seu impacto já foi discutido em negociações já em andamento, incluindo o risco de judicialização de operações em negociação, como a privatização da Sabesp”diz o advogado Lucca Mendes.
O temor, nesse caso, é que potenciais investidores que queiram comprar o controle da Sabesp vejam o negócio com receio de ter que comprar também ações dos acionistas minoritários ou compensá-los no futuro.
A própria Ternium utilizou o argumento de que a decisão do STJ poderia gerar insegurança jurídica. Após a derrota, a empresa pagou por anúncios de página inteira em jornais impressos para publicar um comunicado manifestando sua insatisfação com o resultado do litígio e abordando os riscos que a determinação judicial poderia trazer para futuras operações desse tipo.
“Ao contrariar a jurisprudência estabelecida e consolidada pela CVM e por diversos órgãos judiciais ao longo de 12 anos, incluindo a decisão de mérito do próprio STJ, o julgamento traz insegurança jurídica ao mercado de capitais brasileiro e coloca em risco as operações de fusão e aquisição . aquisição em que há venda de partes de grupos controladores”afirmou a empresa na nota.
Em fato relevante publicado em março de 2023, Ternium afirmou que o grupo teria 61,3% de participação no grupo de controle.
ENTENDA O JULGAMENTO
A 3ª Turma do STJ analisou, na última terça-feira (18 de junho), embargo de declaração da CSN que questionava decisão do próprio tribunal, de 2023. Na época, ao analisar o mérito, entendeu-se que o grupo Ternium não havia adquirido controle da Usiminas e não tinha obrigação de realizar a OPA.
O recurso foi aceito por 3 a 2, e a decisão anterior foi suspensa. Entendeu-se que a transferência do controle acionário resultou na aplicação da determinação constante do artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações, que trata justamente da obrigação do comprador de realizar oferta pública de aquisição de ações.
CSN afirma que a compra de ações da Votorantim e da Camargo Corrêa pela Ternium na Usiminas, anunciada em 2011 e concluída em 2012, resultou na venda do controle da empresa, o que deveria ter resultado em oferta pública de aquisição de ações de sócios minoritários .
A Ternium nega que seja assim, pois, mesmo com a aquisição de 27,7% de participação na época, não detinha mais de 50% delas e, portanto, não seria acionista majoritária da Usiminas. A empresa afirma que não houve suposta mudança de controle na Usiminas e que a decisão do STJ “impacta o mercado de capitais”.
O voto de desempate no julgamento que exige o pagamento de indenização de R$ 5 bilhões à CSN foi do ministro Antonio Carlos Ferreira, que considerou que houve mudança no controle da empresa após a compra de ações pela Ternium.
Ele divergiu dos ministros Ricardo Cueva e Nancy Andrighi, que já haviam votado para que o caso voltasse à primeira instância para produção de novas provas. Os ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro já haviam votado a favor da CSN.
Na votação (na íntegra – PDF – 196 kB) de Moura Ribeiro, que venceu, ele afirma:
“Com a adesão do Grupo Ternium ao bloco de controle em substituição ao grupo Votorantim/Camargo Corrêa, com poder de decisão sobre assuntos relevantes, relativos a assuntos considerados estratégicos para a gestão da Usiminas e, ainda, com a estipulação da necessidade de consenso entre os Grupo Nippon e Grupo Ternium pela indicação do Diretor Presidente da Usiminas, mantenho o entendimento de que houve transferência de controle da Usiminas”.
Em 2023, ao julgar o mérito da causa, o STJ rejeitou o recurso da CSN por maioria de votos. Contudo, entre o julgamento do mérito e a análise dos embargos de declaração, a composição da turma responsável pelo processo foi alterada. Paulo de Tarso Sanseverino morreu e Marco Aurélio Bellizze declarou-se incapaz de julgar.
O QUE DIZEM AS EMPRESAS
Com a derrota na Justiça, a Ternium declarou que irá recorrer da decisão, e que sua posição se baseia em decisões anteriores da CVM e de outros órgãos judiciais.
Em comunicado divulgado após o julgamento, a empresa lista decisões favoráveis a outras empresas ao longo dos anos. Menciona que em 2013, o tribunal de primeira instância negou provimento ao recurso da CSN e, em 2017, o tribunal de segunda instância confirmou a decisão do tribunal de primeira instância. Aqui está o posicionamento completo (PDF – 87 kB).
“A empresa continua acreditando que todas as reivindicações e alegações da CSN são infundadas e sem mérito, conforme confirmado por vários pareceres de consultores jurídicos brasileiros, duas decisões emitidas pelo regulador de valores mobiliários brasileiro em fevereiro de 2012 e dezembro de 2016, as decisões do tribunal de primeira e segunda instância e a decisão do STJ de 7 de março de 2023 acima referida. A empresa considera ainda que a decisão do STJ sobre o pedido de esclarecimentos da CSN é contrária à legislação substantiva e processual aplicável”ele afirmou.
A CSN, também em nota oficial, afirmou que a Ternium “nega ter assumido o controle da Usiminas para evitar o cumprimento da obrigação legal de pagar aos acionistas minoritários”. Além disso, diz que “não é verdade que tenha havido desrespeito à jurisprudência da Comissão de Valores Mobiliários, embora deva respeitar a jurisprudência dos Tribunais brasileiros, e não o contrário”. Leia a nota completa (PDF – 117 kB).
“A Ternium usa subterfúgios políticos e midiáticos para constranger os juízes e o sistema judiciário brasileiro, esquecendo que a lei é o único elemento que verdadeiramente influencia e convence. A CSN espera que a Ternium reveja sua disposição de infringir a lei e desrespeitar publicamente as autoridades brasileiras”diz a nota da CSN.
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